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ESCOLA SEGURA E A TEORIA DAS JANELAS QUEBRADAS


Imagine a seguinte cena: um vendaval atinge seu bairro e um galho de árvore destrói uma das janelas frontais da sua casa. O que você faria após o ocorrido? Boa parte das pessoas iriam imediatamente consertar a janela. Mas não só por uma questão estética, principalmente porque a janela tem uma relação direta com a proteção do imóvel. Se essa condição de segurança é comprometida, a residência torna-se mais vulnerável a ações de marginais.


Diante dessa cena hipotética, porém crível de acontecer, gostaríamos de explicar que, a reação natural das pessoas em reparar a janela pode estar relacionada a uma teoria criminológica nascida em Chicago – EUA, nos anos 80, intitulada Teoria das Janelas Quebradas (Broken Windows Theory), também descrita na literatura pelo termo "desordem gera desordem”.


No ensino, essa teoria tem pertinente espaço quando os educadores passam a associá-la com a ordem no ambiente escolar. É perceptível que os alunos, em geral na fase da adolescência, condicionam seu comportamento por atitudes imitadas, ou seja, há grandes chances de que os adolescentes sejam influenciados por outros indivíduos que promovem desordens e distúrbios na escola.


A teoria pode também ser aplicada levando-se em conta a organização do local de aprendizagem. Algumas práticas organizacionais são aplicadas com intuito de reduzir a indisciplina escolar, prevenir atos infracionais e melhorar a convivência de alunos e educadores, buscando enriquecer a cultura de paz e potencializar o aprendizado.


São exemplos de práticas organizacionais no ambiente escolar:


  • Códigos de idioma: evitar gírias, palavrões, não discriminar através de lugar de fala, etc.;

  • Etiqueta de sala de aula: posicionar cadeiras conforme a posição do orador, demonstrando atenção e interesse pelo que está sendo dito, etc.;

  • Códigos de identificação: uso de uniformes, padrões de acessórios pessoais tais como joias, adereços, bonés, etc.;

  • Códigos de comportamento: estabelecer sentidos de passagem em corredores, subida e descida de escadas, horários para utilização de áreas comuns, etc.


Percebam que a Teoria das Janelas Quebradas vai muito além da simples restauração de uma estrutura física. Ela permite estabelecer uma relação entre o ambiente e o comportamento do indivíduo. Entre 2004 e 2006, Stephen B. Plank e sua equipe da Universidade Johns Hopkins, conduziram um estudo correlacional para determinar o grau em que a aparência física da escola e a sala de aula influenciavam no comportamento do aluno, particularmente em relação às variáveis ​​envolvidas no estudo: medo, desordem social e eficácia coletiva.


Eles coletaram dados de pesquisas administradas de 6 a 8 estudantes por 33 escolas públicas. A partir das análises dos resultados da pesquisa, eles observaram que o medo, a desordem social e a eficácia coletiva apresentaram influências estatisticamente significativas com as condições físicas da escola e da sala de aula.


A conclusão publicada no American Journal of Education, foi que, “consertar janelas quebradas e cuidar da aparência física de uma escola não pode, por si só, garantir um ensino e aprendizado produtivos, mas ignorá-los provavelmente aumenta muito as chances de uma espiral descendente e problemática. Por isso, os educadores devem estar atentos a fatores que influenciam a percepção do estudante em relação ao clima e à segurança do local”.1


As variáveis estudadas pelos autores exercem grande influência na sensação de segurança. O medo, por ser um sentimento intrínseco do indivíduo, resulta em prejuízos físicos e emocionais que podem estar relacionados à diminuição da qualidade de vida, aumento nos casos de estresse e problemas de saúde.


A desordem social pode ser entendida como a deturpação do bem comum, das manifestações sociais e da convivência em sociedade. Sampson, Raundenbush e Earls (1997 apud CRUZ, 2010, p. 41) apontam que a eficácia coletiva é “um complexo sistema formado pela coesão social existente entre os membros de uma vizinhança, pela confiança mútua que se estabelece entre seus moradores e pela disponibilidade que estes têm de controlar o comportamento mútuo e agir em prol do bem comum”.2 Assim, damos ênfase na premissa de que o engajamento do grupo é fundamental para fortalecer a segurança do ambiente e incutir no estudante um sentimento de solidariedade para com seus pares e a equipe gestora da escola.


Nesse artigo, nosso intuito é despertar a atenção dos membros das comunidades escolares para a promoção de condutas que foquem na relação estrutura x comportamento e demonstrar que um ambiente organizado permite aumentar ou diminuir a sensação de segurança dos habitantes. No contexto escolar, essa premissa além de ser verdadeira é também primordial para o desenvolvimento da educação. A segurança, a organização e o conforto, são elementos propulsores de elevados índices de aprendizado na escola.


Não obstante citarmos que a segurança na escola reflete na melhoria do ensino, esta é condição básica para que pais, professores, funcionários e alunos, obtenham expressivo ganho na qualidade de vida e promoção de direitos humanos fundamentais. Nesse sentido, queremos apontar que a escola pode conceber em sua arquitetura, seja ela derivada de construção ou reforma, elementos essenciais de proteção.


Precisamos considerar que muitas das escolas foram construídas há dezenas de anos e que, possivelmente, na época das suas construções, a preocupação com a segurança, especificamente de seus alunos, não era uma pauta latente como vemos hoje em dia. Por essa razão, vários prédios escolares apresentam deficiências arquitetônicas que favorecem a prática de delitos, principalmente os relacionados a violação, dano e furto.


Quando pensamos em construir um imóvel devemos observar condições que o tornem menos suscetível a invasões e depredações e que ele represente significante aumento na sensação de segurança dos habitantes. A arquitetura da escola deve estar voltada para contribuir com o aprendizado dos alunos e ao mesmo tempo dissuadir tanto a ação de criminosos e alunos indisciplinados, bem como, buscar despertar na comunidade escolar, um espírito de autoproteção, conservação e colaboração na segurança do coletivo.


Esse engajamento deve proporcionar nos frequentadores, um ambiente seguro, harmônico e acolhedor. Algumas estratégicas básicas de proteção referem-se a controles de acesso, vigilância natural, reforço territorial e capacitação de pessoal.


O controle de acesso visa criar dificuldades de entrada no ambiente, reduzindo a oportunidade de ser surpreendido por pessoas estranhas ao público escolar, criando a sensação de risco para o delinquente que pretende adentrar no prédio e cometer um delito. Esse controle de acesso pode ser estabelecido:


  • Com a presença de guardas, porteiros ou vigilantes;

  • Através de interfones e câmeras;

  • Pela existência de catracas automatizadas, portões com trancas, correntes e fechaduras;

  • Ou pela delimitação de áreas: comuns, reservadas e restritas.


A vigilância natural limita a ação do delinquente ao causar nele a sensação de que está sendo observado. Quanto maior a visibilidade do local, maior a segurança. Locais com visibilidade obstruída por ofendículos inoperantes, construções inadequadas, acúmulo de objetos, falta de iluminação, falta de manutenção em áreas verdes, entre outros, facilitam a ação do delinquente.


Na construção de escolas, geralmente, opta-se por tipos de cercados dos seguintes materiais: muros em alvenaria, alambrados, grades, estrutura de madeira, estacas de concreto ou cercas de arame farpado. Normalmente, os muros, as grades e o alambrado são os materiais mais utilizados.


Em escolas o ideal é que se use o muro, uma vez que ele não permite a quem está do lado de fora enxergar o que está se passando do lado de dentro da escola, além de ser mais resistente e de difícil violação. Se considerarmos que o público escolar é formado, em maior parte, por crianças, adolescentes e jovens, um sequestrador ou maníaco teria mais facilidade em observar os hábitos e movimentos de sua possível vítima, quando a proteção perimetral for grade ou alambrado. Mas isso se torna mais difícil, caso o material utilizado venha a ser o muro.


O cercado deve ser alto o suficiente para impedir sua transposição por pessoas estranhas. Contudo, não podemos esquecer que, muitos alunos indisciplinados acabam transpondo as barreiras perimetrais da escola para gazear aula. Por isso, chamamos a atenção quanto à utilização de ofendículos como, cercas elétricas, arames farpados, cacos de vidros, entre outros materiais, que podem ser lesivos justamente àqueles que queremos proteger. Sem contar que, esteticamente, aparatos dessa natureza, podem deixar a cara da escola como a de um presídio, reforçando o sentimento de insegurança da comunidade escolar.


A experiência com segurança escolar nos tem feito repensar a utilização de ofendículos, principalmente em unidades de ensino estaduais, por concentrarem estudantes na fase da adolescência, onde a vontade e a capacidade de relacionamento com o “mundo extramuros” torna-se mais acentuada. Nos parece mais apropriado que, em muros que atendam o propósito de servir de barreira perimetral e limítrofe da escola, um piche ou óleo queimado pintado na parte superior contribui para prevenir eventuais atos de indisciplina (efeito dissuasivo) e marcar eventuais intrusos (efeito reativo).


A tecnologia também deve ser levada em consideração. Instalação de câmeras de monitoramento são bastante eficientes na dissuasão do delinquente e, os registros das imagens podem ajudar na identificação e investigação do delito.


O reforço territorial atribui significativa importância ao perímetro da escola, como se fosse uma extensão do ambiente escolar. Um entorno bem cuidado, organizado e limpo, pode refletir positivamente na sensação de segurança e auxiliar na prevenção de delitos. Dessa forma, a comunidade escolar deve cobrar dos órgãos responsáveis a manutenção e a conservação do espaço público como remover pichações, limpeza de terrenos vazios, substituição de lâmpadas queimadas, pavimentação regular, recolhimento de lixo, fechamento de comércios irregulares, etc., bem como, adotar ações comunitárias que busquem promover melhorias nas condições físicas do perímetro escolar.


Vimos no início do texto, que muitos delinquentes preferem lugares malconservados ou com aspecto de abandono para atuar. Crimes de estupro, tráfico de drogas, roubos, e até mesmo homicídios, podem ser relacionados a ambientes negligenciados.


Outra atitude importante que devemos observar, em relação ao entorno das escolas, é evitar aglomerações de alunos em entrada e saídas de turnos e solicitar rotineiramente a presença policial com ações preventivas como palestras de comportamentos individuais de segurança, abordagens a suspeitos e fiscalização em estabelecimentos comerciais.


A capacitação dos funcionários, pedagogos, diretores e professores é também outra ação que procura promover na escola uma cultura de paz e de autoproteção que objetiva alcançar nos indivíduos um espírito de persuasão na comunidade, fazendo com que estes atores se tornem agentes promotores de segurança.

Além desses quatro aspectos importantes para a prevenção de delitos em escolas, apresentaremos algumas vantagens da arquitetura escolar bem planejada:


  • Melhor comportamento social dos alunos e funcionários que passam a agir como promotores de segurança;

  • Menor custo de contratação com pessoal;

  • Reformas menos exigentes;

  • Menor custo de manutenção com instalações físicas.


É necessário também que os alunos estejam inseridos nesse processo e, para isso, nós indicamos a criação de comitês de segurança na escola, composto por representantes dos corpos docente e discentes, de associação de pais e funcionários que possam registrar e acompanhar ocorrências dentro e fora da escola, e discutir ações de reforço na segurança sob a consultoria de agentes públicos.


Só é possível promover segurança se todos os envolvidos se empenharem para o mesmo objetivo. Assim, é imprescindível que a comunidade escolar, o poder público em geral e a polícia, estejam integrados para fazer frente aos criminosos. Lembre-se: Você pode praticar segurança!



1 PLANK, Stephen B.; BRADSHAW, Catherine P.; YOUNG, Hollie. An application of “broken-windows” and related theories to the study of disorder, fear, and collective efficacy in schools. American Journal of Education, v. 115, n. 2, p. 227-247, 2008. Disponível em: <https://www.journals.uchicago.edu/doi/pdfplus/10.1086/595669>. Acesso em: 28 de janeiro de 2019.


2 DA CRUZ, Wilson Jose Antonio. Os entraves para o surgimento da eficácia coletiva: um estudo de casos em um aglomerado de Belo Horizonte. 2010, 190 f. Tese (Programa de Pós-Graduação em Ciências Humanas: Sociologia e Política) - Universidade Federal de Minas Gerais, 2010. Disponível em: <http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/handle/1843/BUOS-8P5FVM/tesedout..pdf?sequence=1>. Acesso em: 28 de janeiro de 2019.



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